sexta-feira, 26 de abril de 2013

Na Tela - A arte da reciclagem



Embora o Dia Mundial do Planeta Terra tenha sido na última segunda, dia 22 de abril, aproveito o tema para falar de um filme que retrata de maneira belíssima a contemporaneidade. Aos mesmo tempo em que mostra o caminho caótico a que parece que o mundo está tomando por consequência do consumo desenfreado, Lixo Extraordinário (Waste Land, 2010) traz de forma clara e poética tantas coisas, e pessoas, que fingimos não ver, pelo menos no cotidiano.

O documentário mostra todas as fases de desenvolvimento de um projeto do artista plástico brasileiro Vik Muniz, em que são envolvidos catadores de material reciclado que tiram do aterro Jardim Gramacho, em Duque de Caxias (RJ), o sustento de suas famílias. O trabalho foi realizado no período de 2007 a 2009 e tinha como objetivo criar obras de arte fazendo uso de materiais reciclados jogados no lixo. Muniz reproduziu obras clássicas e convidou os próprios catadores a serem modelos, além de auxiliarem na seleção dos objetos e na montagem das peça para a fotografia. A vida das pessoas envolvidas foi modificada pelo projeto, mostrando o poder de transformação da arte quando é possível ver beleza onde antes era impensável.

O longa dá um nó na garganta ao fazer o expectador perceber como pode ignorar tantas coisas e pessoas. Uma parcela da população que vive a margem da sociedade consegue se reorganizar em um ambiente com condições precárias para ganhar a vida de maneira honesta. É de engolir a seco os depoimentos dos personagens que dizem se alimentar com o que outros jogam fora. As vezes nem todas as folhas do molho de alface estão ruim e o iogurte fora da validade ainda pode ser consumido.

São quatro os catadores que se destacam como personagens. Zumbi, que é visto como a figura intelectual. Responsável por montar uma biblioteca no aterro com os livros que encontrou no lixo, Gramacho é sua forma de sustento desde os nove anos. Suelem também começou a trabalhar no aterro muito cedo, aos sete anos. Na época das gravações, ela tinha dois filhos e estava grávida do terceiro. Embora não visse problema em ser catadora de lixo, tinha o sonho de poder ficar em casa para acompanhar o crescimento das crianças. Isis é, talvez, a mais sonhadora do grupo. Vaidosa e com interesse em moda, é a que aparenta ter se apegado mais ao projeto de Vik Muniz. Ela não gosta de trabalhar no aterro e vê no trabalho com o artista a chance de mudar de vida. É, sem dúvidas, quem o universo artístico conseguiu intervir na vida em todas as esferas. Tião é o personagem que ganha um pouco mais de destaque. Com um jeito simples e cativante, conta sua história e como aos poucos ganhou destaque na luta por direitos dos trabalhadores do aterro. Ele é quem viaja com Muniz acompanha o leilão das peças, resultado do projeto. De perto, ele vê a fotografia que ajudou a criar conquistar o público e ser vendida por 28 mil libras.


É incrível se dar conta de como o que nos parece sem serventia ganha outra função, outro significado. O lixo é transformado em casa, alimento, dinheiro, brinquedo, obra de arte, filme. Pessoas que se tornam invisíveis em meio a imensidão de coisas descartáveis definem quem somos, nosso estilo de vida, nossa classe social, ao olhar para o saco de lixo ainda fechado e ver suas formas, seu peso e o barulho dos objetos dentro dele. Somos facilmente decifráveis. Encaixamo-nos em rótulos por meio de embalagens que jogamos fora.



Lixo Extraordinário conquistou diversos prêmios ao redor do mundo, incluindo Prêmio da Anistia Internacional e Prêmio do Público de Melhor Documentário, ambos no Festival de Berlim, em 2010.

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