terça-feira, 28 de maio de 2013

Quem conta um conto - Reeducando os olhos

Como é difícil ver. Isso mesmo. Ver fica cada dia mais complexo. Caminhos rotineiros parecem novos. Velhos hábitos tornam-se novidade. O olhar muda conforme o estado de espírito. De surpresa detalhes saltam aos olhos. Perspectivas trazem leituras adversas. Pontos de vista transformam fatos em versões.

Rubem Alves traz essa dificuldade em sua crônica A complicada arte de ver. A personagem que vai ao analista acha que está louca porque de repente começou a ver o ato de cozinhar de uma outra forma. O óbvio cedeu lugar ao desconhecido. Um novo mundo se mostrou de forma inesperada. Os alimentos deixaram de ser comida para se transformarem em obra de arte. Delírio? Loucura? Ou perspectiva fora do lugar comum?

Ao longo de sua obra, Rubem Alves gosta de citar a inocência e poder de imaginação das crianças ao lidarem com as mais diversas situações. Tudo parece confuso ao mesmo tempo que soluções são descobertas em um piscar de olhos. A restrição do pode e do que não pode, do que é certo e do que é errado vêm por meio de experiências. O mundo é posto de forma mais clara. Tudo é oportunidade. O cachorro é o dragão que quer destruir a cidade, o lençol é a capa do super-herói, um pedaço de madeira é a espada.


Mais complexo do que aprender a ver é reensinar os olhos a enxergarem o habitual de outra maneira. E se durante todo esse tempo olhamos para algo de tal ângulo que temos a visão distorcida? Um prédio visto de perto é alto, visto do alto, é pequeno.

Enxergar não é tarefa fácil. Exige treinamento, dedicação, esforço. Não é como aprender de uma hora para outras. Aos poucos flashs iluminam percepções antes tão sólidas. O ruído se transforma em música, o lixo, em luxo. Como escreveu José Saramago "Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.".

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