terça-feira, 14 de maio de 2013

Quem conta um conto - Para romper amarras, poesia

"Já também amei as flores,
As mulheres, o arrebol, 
E o sino que chora triste,
Ao morno calor do sol.
Ouvi saudoso a viola,
Que ao sertanejo consola,
Junto à fogueira do lar,
Amei a linda serrana,
Cantando a mole tirana,
Pelas noites de luar!"
          Adeus, meu canto

Um país construído com o suor e o sangue de raças vistas como inferiores. A cor da pele como definição de classe social, de civilização. A história marcada junto com a pele que recebeu o golpe de chibata. A arte como forma de contestação de uma realidade preconceituosa que deixou reflexos até os dias atuais. A literatura como fonte de denúncia de injustiças contemporâneas. Castro Alves, o 'poeta dos escravos'.

Obra de tom contestador. Relatos das senzalas, do trabalho forçado, da saudade. Enfim o explorado vira centro da narrativa. Escravos deixam de ser fonte de renda para serem fonte de inspiração. Os habitantes vindos de terras distantes ganharam voz. O baiano Castro Alves se colocou como porta-voz de angústias de quem vivia em condições subalternas. A luta pela liberdade através de palavras, de ideias, de ideais, de poemas.

"Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o sol vem;
Esta terra é mais bonita, 
Mas à outra eu quero bem!"
          A canção do africano

Com uma breve carreira na literatura, Castro Alves não possui uma biografia extensa. Em sua obra aparecem resquícios da segunda geração do romantismo, atendo-se a figura feminina, mas sem idealizá-la exageradamente. A representação da mulher continua a aparecer durante a crítica à escravidão ao relatar a dor das mães, que temem que seus filhos sejam tirados pelos senhores ou que as crianças sofram devido o trabalho forçado. A mulher aparece como uma figura sensível e protetora.

"Chorai, orvalhos da noite,
Soluçai, ventos errantes. 
Astros da noite brilhantes
Sede os círios do infeliz! 
Que o cadáver insepulto, 
Nas praças abandonado, 
É um verbo de luz, um brado
Que a liberdade prediz."
          Antítese

Um de seus poemas de maior destaque é O Navio Negreiro, que conta a trajetória dos escravos da terra natal até ancorar no Brasil. A viagem em condições precárias, a violência com que são tirados de suas famílias, as incertezas do destino, a brutalidade dos homens brancos europeus.

"São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão..."
          O Navio Negreiro

A escravidão de tribos indígenas também aparece nos poemas de Castro Alves. Mesmo protegidos pela Igreja, que via os nativos brasileiros como seres puros de alma que deveriam ser catequizados, os índios sofriam com os horrores do trabalho forçado e da violência principalmente nos grandes engenhos.

"A filha das matas — cabocla morena —
Se inclina indolente sonhando talvez!
A fronte nos Andes reclina serena.
E o Atlântico humilde se estende a seus pés."
          América

Embora tanto tenha se dedicado a escrever poesia voltada para o social de sua época, Castro Alves não pode ver o passo que o Brasil dava com a assinatura da Lei Áurea, pela Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888. O poeta romancista faleceu aos 24 anos, em 6 de julho de 1871, em Salvador. Admirado por escritores, recebeu elogios de Ruy Barbosa, José de Alencar, Machado de Assis, entre outros.

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