quinta-feira, 2 de maio de 2013

Na Tela - Inquietudes e inocência


A vida não é fácil. A afirmação pode parecer clichê ou adicionada de um drama sem fundamento, mas é verdade. O cinema volta e meia retrata as dificuldades que inquietam a alma humana. E o faz muito bem. No longa-metragem argentino Valentin (2002) questionamentos atordoados são postos através dos olhos de um pequeno menino de 9 anos, personagem que dá nome ao filme. É difícil enxergar através dos óculos dele. Não que o grau das lentes atrapalhe, mas a complexidade das situações que se desencadeiam traz o inquietamento de quão dura pode ser a realidade.

Valentin (Rodrigo Noya) é um prodígio. Com uma astucia de causar inveja em muitas pessoas, ele tem o sonho de ser astronauta e ser o primeiro a pisar na Lua - o filme se passa em 1960; Neil Armstrong realizou o feito em 1969. Empenhado a entrar para a história, Valentin treina todos os dias, além de fazer os equipamentos que auxiliavam em seus testes por conta própria, como os sapatos para andar na falta de gravidade. Não é atoa que é chamado de anãozinho, dado a inteligência espantosa para a idade. Os diálogos com o vizinho pianista, que mais tarde torna-se amigo do menino, dão um tom de comédia ao longo ao mesmo tempo em que expõe a cumplicidade e o valor do escutar o que o outro tem a dizer.

Tanto a mãe como o pai são figuras ausentes na vida de Valentin. A mãe está afastada e não o vê há anos. Embora ele sinta falta, mesmo não lembrando do rosto dela, o pai nunca cede que Valentin reencontre-a. Enquanto isso, a avó paterna (Carmen Maura) é quem supre o papel dos dois na criação e no cuidado com o menino. Com o humor um pouco volúvel depois da morte do esposo, a avó é a principal companheira do menino. A postura rude e pouco amigável é compreendida no decorrer do longa. Depois de sofrer com decepções e perdas, a velha senhora tenta preservar - a sua maneira - o que restou.


Com altos e baixos, Valentin sempre tem renovada a ilusão de que a nova namorada do pai pode ser a escolhida para preencher a lacuna deixada pela mãe. Mesmo com todo o carinho da avó e do tio que os visita esporadicamente, o menino ainda sente falta de alguém que possa ocupar esse lugar. Leticia (Julieta Cardinali) é a namorada do pai de Valentin que mais agrada ao menino. Calma e delicada, ela é parece ser a única, entre tantas outras, que se dispôs a escutar as inquietações do 'anãozinho'.


É difícil não sentir o coração apertado conforme o final do longa se aproxima e Valentin tem novos desapontamentos. A ausência brutal do pai se faz presente de maneira arrebatadora. Com ótima interpretação, o menino constrói um dos pontos altos do filme ao expressar o que sentia quando se vê decepcionado com Leticia, resultado da decisão tomada pela moça de não procurá-lo ao terminar o namoro, acabando com a chance de se tornar a mãe substituta.

O filme termina com um respiro positivo. Essa deve ser a deixa para nos lembrar que a inocência da infância faz com que problemas possam ser resolvidos sem a complicação que os adultos teimam em colocar como obstáculo ao não arriscar. Com certeza é vitorioso com se arrisca a buscar os sonhos mais distantes, nem que seja na Lua.



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